terça-feira, 29 de julho de 2014

Civilização Humanamente Demasiada - por Tito Oliveira

Por Tito Oliveira - da série "Enscenario Para Perros Y Desmembrados" -
nanquim sobre papel vegetal sobreposto -
45x30cm - acervo da Fundacion Spai Fonta -
Barcelona 2010. 

A guerra entre Israel e Palestina nos faz analisar que a desenvoltura dos acontecimentos no Oriente Médio e nos demais cenários de ações terroristas pode ser interpretado como um ataque específico para o mundo contemporâneo. 

Neste sentido, nos compete o entusiasmo de uma violência desesperada dos que se encontram dispostos a sacrificassem em prol de um ideal ético-religioso. 

Parece-me incontestável que um dos aspectos essenciais dos conflitos em questão antre ambos inimigos reside em um plano de secularização de nossas sociedades. 

É difícil decifrar as reais causas que desenvolvera tamanha complexidade, da qual conhecemos exclusivamente a vertente remanescente: rivalidade medieval entre o paganismo e o império, além da reforma protestante, não sendo necessário discorrer sobre as demais etapas da secularização de sociedades europeias. 

Essa atitude, que na década de 30 caracterizava intelectuais como céticos e fazia destes uma autentica Classe-no–Classe, capazes do rompimento com ideologias quaisquer, se traduz em geral no consumismo de cidadãos que consistem na grande massa. 

Tal consumismo é direcionado tanto para a matéria quanto para a in(e)formação, ambos devidamente condizentes com os pacotes industrializados que constituem o globo terrestre. 

Nietzsche escreveu que “somos materiais de uma sociedade”, afirmando em metáfora que nosso grau de caracterização individual corrompe a fragmentação da hegemonia e estabelece uma hierarquia composta por superiores e subalternos, contribuindo para o caráter heterogêneo no poderio e/ou subserviência das nações. 

Esta é a exata situação de um individuo da grande massa em nossa sociedade, baseado em que muitos desses se fundamentam; no ponto de vista econômico e social, no principio de homologação de seus custos (dentro de seus alcances ou não), de seus comportamentos e de seus valores. 

Como as sociedades antigas, infelizmente, em muitas de suas características comunitárias tradicionais, tal homologação de custos, se dá, em verdade, em associações e/ou relativas a valores individuais. 

Não seria esse tipo de atitude que nos leva rumo aos valores individuais e nos capacitam a respeitar os países considerados absolutos um dos fatores determinantes do declínio de nossa civilização? 

Estaríamos então expondo os valores ao declino das civilizações? Ou, melhor dizendo; não seria mais interessante inverter essa última expressão e falar de uma civilização em declínio? 

Este é um assunto delicado, pois o mundo em que vivemos considera obrigado expressar-se em termos de desenvolvimento. Prevalecendo a ilusão.

Se refletirmos a questão dos valores inevitavelmente nos depararemos com o caráter de secularização, sobretudo se tratando da secularização não consumada dos denominados países de terceiro mundo, nos quais se origina o terrorismo que nos ameaça, ou, talvez; pensemos que não, pois convivemos com terrorismos em todas as partes dessa entropia social. 

A impressão que tenho é que somos condicionados a creditar o mito historicista do processo linear, segundo o qual as sociedades de terceiro mundo deveriam seguir avançando e alcançando o nível dos países subdesenvolvidos ou desenvolvidos.  No entanto, não seria tudo isso mais um mito simplificador? 

Podemos nos referir aos países de terceiro mundo, estigmatizados por numerosas conseqüências de dominações coloniais, como incapazes de desenvolver uma burguesia etimológica suscetível de dirigir países de recente independência sem subscrever o eurocentrismo disfarçado de secularização não consumada, ou a ideologia universalista dos anseios humanos definidos por nossas organizações internacionais? Podemos encontrar um terceiro viés entre o eurocentrismo e o universalismo? 

Poderia ser uma negociação explícita que respeitasse as diferenças entre as tradições, sem depreciar as demais. Tal ação deve amadurecer, em primeira instância, entre nós, para evitarmos cair no erro de pensarmos que a única forma de transgredir aos assaltos de grupos ou sociedades fundamentalistas é retrocedermos ao próprio fundamentalismo. 

Talvez seja certo que o romantismo da situação reside em nossa maneira de vivermos tais valores. Nos dias atuais, a força e a vulnerabilidade do Ocidente se encontram no fato de que eles já não acreditam nelas, enquanto nossos adversários são fanáticos e dispostos a morrer, sobretudo, morrer para matar. 

Cair em tamanha tentação de voltar à violência, ao caos, significaria, em latim; propter vitam vivendi perdere causas. Ou seja, sobreviver na condição de desistir do que constitui nossa vida, não no sentido biológico, mas nos sentidos éticos e biográficos. 

A secularização não consumada é, literalmente, um fenômeno que mais nos preocupa. Isso não significa que devemos renunciar por completo a ação militar em nosso modo de agir, mas, que devemos tomar consciência de que, quando as armas se convertem em uma única solução, estão esgotadas as possibilidades de nos resgatarmos da estupidez. 

No momento em que colocamos em risco a nossa própria vida, nos submetendo à derrota militar ou à continuação de insegurança, que sofre, por exemplo, a Palestina, condenada a ser uma civilização em declínio, nos opomos a única possibilidade de evitar as condições para um terrorismo em massa. 


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