domingo, 14 de setembro de 2014

CINEMA - c r í t i c a / d i c a - "Namorados Para Sempre" (Blue Valentine) - por Tito Oliveira

Protagonizado por dois dos mais promissores atores do cinema contemporâneo, o indicado ao Oscar em 2011 "Namorados Para Sempre", de título original "Blue Valentine", muito bem dirigido por Derek Cianfrance é denso e envolvente. 

Trata-se de um longo casamento entre dois jovens de classe operária e uma filha de 5 anos de idade. 

Juntos atravessam uma de suas piores crises conjugais. Cindy (Michelle Williams) e Dean (Ryan Gosling) não controlam a transformação da relação e acabam por tornarem-se cúmplices de uma invasão de incertezas que contaminam suas vidas. Ele trabalha como pintor, enquanto que ela é enfermeira de uma clínica médica. Ambos seguem rumo a uma tentativa quase ilusória na superação de tais conflitos, comumente referenciando-se num passado que evocou a paixão que os uniu.

Sua natureza apresenta a beleza estendendo-se ao dissabor da angustia. 

Comove e inquieta não somente pelo bom texto, mas também por como discorre friamente sobre seus desdobramentos.

A narrativa enfatiza a convivência conjugal em meio à modernidade dos tempos, descrevendo minuciosamente os gestos e a rotina que implicam na reavaliação do que se faz da fato relevante numa relação. 

Do encantamento ao tédio, do amor ao ódio. Percursos bifurcados, possível nos mais diversos contextos emocionais.

A evidência situa-se mais precisamente em Dean e Cindy, cujo roteiro despreza a linearidade. Em dado momento pode-se ver seu presente com toda profundidade e intimidade de anos numa convivência amorosa, em outro o resgate do passado quase fantasioso de tão extraordinário que se deu no início da paixão entre ambos. Sedução e cansaço se fundem paralelamente no desbravar do romance, inserindo o espectador na compreensão peculiar da história de amor, seja esta de que perspectiva lhe couber.

Nota-se, contudo, existir paixão. Os personagens esboçam tentativas quase que desesperadoras de resgate com insinuações que nos inquietam da sedução ao constrangimento. Em meio a quentes sugestões apresentadas por Cindy, onde maior provocação se dá na vergonha que ambos acabam por sentir um do outro, emergem nuances inspiradoras em vivências efêmeras e espaçadas no que diz respeito ao deleite. Uma das sugestões mais sofisticadas em todo drama se dá nos gestos simples que permeiam a atmosfera encantadora do, inicialmente, grande amor. 

A profundidade nos diálogos é entranhada e reflete a ilusão da expectativa na variação espirituosa de seus personagens ao longo do tempo. O fantasma do compromisso, a dedicação, o arrefecer da paixão, as dificuldades, o desgaste na rotina e a insegurança são teores apresentados com o terror de um terremoto seguido de um tsunami avassalador. 

As atuações de Ryan Gosling e Michelle Williams têm a dimensão e consistência equivalentes à beleza de uma Vênus. Onde suas expressões e gestos em meio à cenas de ausente fala constituem o maior signo do que afirmo. O traço verossímil intrínseco no casamento entre Dean e Cindy se faz tão contundente que poderia dizer, em certo modo, incomodar. 

Se é possível apreender narrativa extraordinária, esta transita exímia de possíveis concessões. Pois os atores são dirigidos na submissão de cenas emocionalmente inóspitas de exposição moral, lamentáveis pelo ausente suspense sobre a conclusão da história. 

Derek Cianfrance discursa com maestria sobre o contraponto entre amor e ódio, tornando o registro tal como um tratado filosófico ao nos dispor a inevitável reflexão perante o que se pré-define na candidatura à experiência de uma entrega amorosa. 

Logo, muito cuidado. Não limite-se à projeção do que não controla, apenas adormeça e amanheça já sabendo que, de fato, deve falar apenas por si. Genial!

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