quarta-feira, 17 de setembro de 2014

POUCAS & BOAS - "Campo Minado" - por Tito Oliveira

Por Tito Oliveira - da série Composto De Um Tempo Documentado -
"Versão Pictórica Da Fotografia" -  guache sobre papel - 135X100cm - Sergipe - 2014
Enquanto professor da rede municipal e estadual de Salvador e região metropolitana é, para mim, fácil entender a grave situação de educadores, atualmente, nas salas de aula do Brasil. 

A situação da qual discorrerei agora emergiu por meio de uma matéria da BBC Brasil (que pode ser vista AQUI), onde denuncia ocasiões de violência sofridas pelos professores em escolas brasileiras, sejam estas públicas ou particulares, apresentando também depoimentos gritantes sobre o assunto. 

Numa das escolas onde ensino também é situada num bairro periférico de Salvador, na Bahia, porém tem direção muito boa, onde com muita competência imprime, não em totalidade, mas, em boa parte de seu desafio, bastante controle no que diz respeito à disciplina. 

Meu primeiro dia por lá foi quase perfeito, a não ser quando adentrei a sala da turma 7ºA. 

Havia muita euforia na ocasião e, em meio a quase 40 alunos, era preciso amenizar os ânimos para aproveitarmos os curtos 50 minutos de aula que temos. 

Quando, em dado momento, me dei conta de que não estava conseguindo completar ao menos a lista de presença e fui forçado à alertar alguns alunos. 

Meu gesto, ainda que consciente e educado, não foi bem visto pela maioria que não estava interessada em estudar. 

Obviamente, eu não estava conseguindo desenvolver a aula no dia em questão, também não levei a situação à direção, demonstrei apenas um pouco de tristeza e falei-lhes sobre o dilema na educação brasileira, apresentado-lhes, simultaneamente, dados que indicavam a falta de educação como grande responsável pela decadência social, cultural e econômica no país. 

Porém foi inútil no momento, pois como não havia ocorrido tragédia física, a exemplo da situação com o professor de bilogia descrito na matéria publicada na BBC Brasil, onde o aluno arremessou uma placa de azulejo em seu rosto, poucos prestavam a atenção. 

Então esqueci um pouco a minha aula e comecei a falar da realidade na periferia, me envolver um pouco na atmosfera dos alunos, falar a linguagem deles, da sua cultura, do que gostam de fazer etc.

Foi quando percebi que eles começaram a me escutar. 

O sino bateu, a "aula" encerrou e o clima ficou com um tom de reflexão entre eles. 

Em minha segunda aula nesta mesma turma todos pediram-me desculpas, desejaram-me boas vindas e foram mais dedicados em minha aula. 

Ou seja, creio que em muitos casos da realidade na educação brasileira um professor não deve ser apenas um educador, mas um assistente social bem como um líder comunitário. 

Entendi que é preciso, antes de tentar ensiná-los teores meramente didáticos, aprender com eles ao mesmo tempo que os ensina. 

Eles são como uma consequência de uma causa ainda mais algoz: o descaso. Logo, é necessário adquirir, também antes, suas confianças. 

Eles precisam sentir-se seguros e acreditar no professor antes de segui-lo. 

No entanto, tal postura não o livrará de ser tachado como um racista se, por um acaso; em meio a uma aula de arte, você evitar o contato físico com um aluno negro com as mãos meladas de tinta apenas para manter-se limpo. Uma vez que necessitará deslocar-se para continuar o trabalho em uma outra escola, onde também leciona. 

Quer dizer, quando não existe clareza sobre os fatos através de devida orientação perante recorrentes situações de racismo no Brasil e no mundo, para ser injustiçado basta sair de casa. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário